Opinião: O fim do sempre foi assim está mais próximo do que pode parecer. … ou a IA vai tomar o seu lugar
Confira neste post a opinião de Rose Ramos, Founder e CEO da MatchIT, sobre os impactos da inovação nas empresas e mindset da liderança.
O fim do sempre foi assim está mais próximo do que pode parecer.
… ou a IA vai tomar o seu lugar
Há mais de 10 anos recebi um convite para trabalhar no primeiro movimento de transformação digital de uma grande corporação brasileira. Claro que o nome do desafio não era esse, a gente chamava de redesenho de processos e de engajamento de uma equipe em novas formas de trabalhar, quebrando silos e focando no valor para o cliente. Me pareceu à época que a proposta fazia sentido, eu vinha trabalhando em conectar equipes diferentes e motivá-las a trabalhar em prol de um mesmo objetivo há anos e, mesmo mudando o foco de Operações para TI ainda me sentia com bastante capacidade a aportar. E aprender sobre tecnologia me estimulava muito, era como uma folha em branco.
Sim, fui trabalhar em TI sabendo que uma coisa você chutava e outra você xingava.
Uma década se passou e em 2023 finalmente nos vemos num planeta que de certa forma controlou a crise mundial da Covid-19, mas seus efeitos na aceleração da digitalização dos negócios não esmoreceram. O trabalho remoto é realidade para diversas funções e em negócios de distintos portes e segmentos, e os processos ágeis não são mais ficção de um universo longínquo existente só no MIT ou em Stanford.
Ao mesmo tempo, já é raro que um líder corporativo não tenha a clareza de que a automação de processos, a inteligência de dados que são gerados de forma exponencial e o foco explícito no engajamento de clientes são essenciais para a sustentabilidade de suas empresas no médio prazo e para o atingimento de suas metas hoje.
Ok, mas cadê os Devs?
A despeito desse movimento positivo rumo à digitalização dos negócios, não faltam relatórios e notícias alarmantes sobre a escassez de profissionais tecnicamente qualificados para implementar, evoluir e sustentar os projetos de TI que cada vez mais são mandatórios nos roadmaps estratégicos das empresas. É fato que se ouvem casos de desligamentos massivos em empresas de tecnologia, mas nas listas abertas de recolocação divulgadas após esses eventos é bem raro encontrar profissionais técnicos especialistas. A escassez e alto valor desses profissionais se mantém como grande ponto de atenção de empresas de diferentes setores, e como algo que tira o sono de Tech Recruiters.
Recentemente, chegou o boom do Chat GTP e, se por um lado é algo que tem gerado um bom pânico sobre seu potencial de substituição de diversos profissionais do mercado, por outro trouxe a esperança de que códigos possam ser construídos de forma auto-generativa a partir de histórias de negócios bem escritas e requisitos bem especificados por especialistas de negócios, sanando com isso não apenas nossa curiosidade em ver o resultado de textos curtos feitos hoje para nos entreter mas com o potencial de sanar uma lacuna crítica à evolução digital dos negócios, a falta de desenvolvedores especializados.
Até poderia ser, e se o caminho não for por aí um outro existirá, seja com base em no-code ou outra solução. Recentemente li um artigo de César Gon que comentava que há algumas décadas as telefonistas eram profissionais tão escassas e necessárias que seria preciso que toda a população européia se formasse nessa profissão para dar conta da demanda. Obviamente o mercado se regulou e o mesmo deve ocorrer no contexto das equipes de TI.
“Nada do que é humano me é estranho.”
Assim, o que me preocupa mais e que talvez não esteja ainda tão popular como as discussões em torno dos impactos técnicos da IA em nossas vidas, é a capacidade humana de de fato gerar valor aos negócios pelo que temos de único, nossos softs skills.
Acredito que a evolução dos negócios e a sustentabilidade de suas propostas de valor para a sociedade requerem não apenas as habilidades exatas mas os diferenciais humanos das pessoas que os compõem. E a chave do sucesso está na conexão das habilidades humanas, no encontro do diferente, nas conexões e parcerias reais entre pessoas com histórias e ideias divergentes. E na inovação que isso promove.
Convenhamos: por mais que as relações entre países nem sempre sejam diplomáticas, o trabalho remoto se manterá e a concorrência de seu negócio pode estar em qualquer parte do mundo. As soluções digitais de facilitação de conversas multi-idiomas em tempo real já estão aí, as fintechs e novas regulações para facilitar o fluxo financeiro internacional também. Se você não estiver ouvindo as opiniões de pessoas com vivências diferentes da que você encontra em seu bairro, estará perdendo vantagem competitiva já. Não é para o plano 2030.
Por favor, abramos as caixas!
Além disso, a tecnologia será cada vez mais parte inerente dos negócios e muito provavelmente as aplicações de IA assumirão boa parte dos trabalhos lógicos nos fluxos de processos. Ter uma boa noção do que está acontecendo por trás das caixas pretas dos algorítmos e alguma boa habilidade para identificar quando um output de decisão não soa bem é o que vai diferenciar os profissioanais nesse contexto.
Acredite, essa habilidade não está restrita a quem cursou engenharia. Sua construção está sim muito mais conectada à sua capacidade de aprendizagem contínua, de construir correlações, de avaliar causa-impacto, de ter empatia, de ter curiosidade, de ter repertório. E esses elementos do saber são exercitados quando nos relacionamos com pessoas diferentes, quando interagimos em comunidades e ecossistemas diversos, quando conseguimos nos relacionar e gerar engajamento com quem pensa diferente.
Essa habilidade humana, que eu arriscaria chamar de NH – ou Natural Humanity – em contraponto à Inteligência artificial, é o que acredito que fará mesmo a diferença num tempo cada vez mais próximo em que nossa sobrevivência realmente dependerá da ética e da atençao às normas de compliance e regulamentação da tecnologia em prol da equidade de direitos humanos. São, por fim, os softskills que diferenciarão os profissionais de alto valor.
Há harmonia e equilíbrio no que somos.
Termino a reflexão com uma sugestão às corporações e às pessoas. Que as corporações, representadas por sua liderança executiva, realmente priorizem em suas metas não só a aceleração da adoção tecnológica, mas a preparação de seus talentos para viverem em um cenário em que não se poderá mais ganhar sozinho, ter performance sem propósito, evitar os diferentes. A transformação nas práticas de gestão, trazendo humanização, colaboração e diversidade aos times precisa estar na meta de hoje. Não na visão de longo prazo.
Aos profissionais que se veem hoje como líderes ou estão em formação para liderarem no futuro, deixo o convite para que busquem e promovam experiências distintas, com espaços para conhecer o novo, experimentar o diferente, conectar com quem não faz parte do seu clube. É desse lugar que virá o espaço para inovar, para ser relevante, para potencializar resultados e gerar impacto positivo.