Quem lidera a Inovação?

Quem lidera a Inovação?

Como o organograma corporativo pode acelerar (ou travar) os resultados da inovação nas organizações? Confira as respostas em entrevista exclusiva com o especialista PhD Jamil Farkatt, líder do núcleo de empreendedorismo e inovação da USP, AUSPIN. 

 

Jamil Farkatt: Conectando inovação corporativa, empreendedorismo e academia 

Jamil Farkatt é um exemplo de profissional multifacetado no ecossistema de inovação. Jamil é membro do Programa de Formação em Gestão Acadêmica da Inovação e Empreendedorismo (PGI) da Agência USP de Inovação (AUSPIN). Ele é responsável por gerenciar o gabinete de inovação da Agência na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (ESALQ-USP), onde lidera iniciativas estratégicas para promover a inovação aberta e o empreendedorismo no ambiente acadêmico.  

Com mais de 15 anos de experiência, Jamil Farkatt é Doutor (PhD) em Engenharia e Gestão Industrial pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP). Sua formação acadêmica inclui especializações em Gestão de Projetos Tecnológicos pela Universidad de León (ULe) e em Empreendedorismo e Inovação pela Porto Business School (PBS) e Nova School of Business and Economics (Nova SBE), realizadas em parceria com a University of California, Berkeley (UC Berkeley) e o Google. 

Na Universidade de São Paulo (USP), Jamil combina ensino, pesquisa e liderança estratégica no campo da inovação, com uma ênfase destacada no agronegócio. Ele atua na formação de novos talentos empreendedores e desenvolve pesquisas avançadas sobre a internacionalização de startups. Sua contribuição vai além da academia, ao liderar projetos que conectam a USP, especialmente a ESALQ, ao ecossistema de inovação, promovendo colaborações estratégicas entre entidades, startups, médias e grandes empresas. 

Ao longo de sua jornada, Jamil combinou sua formação acadêmica robusta com experiências práticas no mercado. Jamil deu início à sua trajetória em inovação ainda na graduação, em 2009, no Rio Grande do Norte, conectando tecnologias acadêmicas desenvolvidas no Centro de Tecnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (CT/UFRN) com arranjos produtivos locais. Desde então, sua carreira se consolidou por meio de projetos de impacto no Brasil e na Europa, unindo pesquisa de ponta e inovação aplicada. 

Fundador do Onze19 Innovation Lab (Instagram: @onze19lab), Jamil lidera a única aceleradora de startups do Nordeste reconhecida pela FAPESP, a principal fundação estadual de apoio à pesquisa e inovação no Brasil. Seu trabalho é marcado por resultados expressivos: mais de 100 ideias, startups e projetos de inovação acelerados; mais de 30 desafios de inovação validados e conectados a soluções tecnológicas; mais de 30 palestras e workshops realizados; e a implementação ou gestão de mais de 10 hubs de inovação digital. Além disso, ele contribuiu com a organização e participação em mais de 15 eventos de inovação, incluindo demodays, pitchdays, conferências e feiras, impactando diretamente mais de 20 organizações e empresas de médio e grande porte. 

Para acompanhar sua trajetória ou conectar-se a ele, acesse o perfil no LinkedIn: linkedin.com/in/jamilfarkatt.  

 

Modelos de Liderança em Inovação 

As estruturas de liderança para inovação variam de acordo com a maturidade organizacional e cultural da empresa. Os três modelos principais — Centralizado, Descentralizado e Híbrido — apresentam vantagens e desafios, e a escolha de qual adotar depende do contexto da organização. 

 

Modelo 

centralizado 

Nesse modelo, a inovação é conduzida por uma área dedicada, geralmente vinculada a um executivo de alto nível, como um VP de inovação ou até diretamente ao CEO. Essa abordagem é útil em organizações com baixa maturidade em inovação, pois concentra a responsabilidade e facilita a alocação de recursos. 

Entretanto, essa estrutura pode criar barreiras culturais. Quando a inovação é vista como um projeto isolado de um “departamento exclusivo”, falta engajamento das equipes operacionais. Além disso, a centralização pode dificultar a agilidade em empresas maiores, onde as demandas locais nem sempre chegam à liderança de inovação. 

 

 

Modelo descentralizado 

Nesse formato, a inovação é pulverizada por diferentes áreas, com equipes autônomas identificando e desenvolvendo oportunidades localmente. Aqui, a liderança age como um facilitador, formando embaixadores e promovendo uma cultura de experimentação e aprendizado contínuo. 

Embora esse modelo promova agilidade e diversidade, ele requer um nível elevado de maturidade organizacional para evitar esforços descoordenados. Quando não há um alinhamento estratégico central, a inovação descentralizada pode gerar redundâncias e dificultar a medição de impacto. 

 

Modelo  

híbrido 

Esse modelo combina uma governança central com grupos de embaixadores, hubs ou núcleos de inovação espalhados pela organização. Ele permite a coordenação estratégica ao mesmo tempo que aproveita a agilidade das iniciativas locais. 

O híbrido é o mais eficaz para alinhar cultura, estratégia e execução. No entanto, exige líderes que entendam o contexto do negócio, o mercado e o potencial de cada área, além de habilidades para gerenciar múltiplas frentes sem perder a coesão. 

 

Cultura e Change Management são Fundamentais  

Independentemente da estrutura escolhida, a liderança de inovação só será efetiva se houver transformação cultural. Como o próprio Jamil aponta, cultura não é construída do zero — ela é transformada. Para que isso ocorra, o líder deve começar com uma leitura profunda do contexto organizacional e do mercado. 

Essa leitura abrange: 

  1. O ambiente interno: O líder deve compreender as forças e limitações culturais da empresa, desde a alta liderança até os colaboradores na operação. É necessário conversar com todos os níveis para mapear resistências, valores e oportunidades. 
  1. O ambiente externo: Entender tendências de mercado, práticas de concorrentes e forças externas que moldam a necessidade de inovação é crucial. Um líder que ignora o contexto externo corre o risco de propor iniciativas desalinhadas com a realidade competitiva. 

Além disso, o líder precisa refletir sobre suas próprias habilidades e estar disposto a “walk the talk”. Transformação cultural começa com o exemplo: um líder de inovação que não demonstra abertura para mudança, colaboração ou experimentação dificilmente engajará sua equipe. 

Change management é uma peça-chave nesse processo, ajudando a alinhar as mudanças culturais com os objetivos estratégicos da inovação. Ele exige disciplina, empatia e comunicação consistente, permitindo que a organização transite de um modelo tradicional para um mais ágil e inovador. 

 

O Papel Estratégico da Liderança: Transformação e Execução 

O papel do líder de inovação vai além de gerenciar processos. Ele atua como um arquiteto estratégico, conectando cultura, mercado e execução. Para isso, é essencial: 

  • Desenvolver um plano estratégico claro para a inovação, alinhado às metas corporativas. 
  • Construir pontes entre diferentes departamentos, incentivando colaboração transversal. 
  • Ser um facilitador de recursos e um mentor para as equipes. 

Por fim, a liderança para inovação não é sobre protagonismo, mas sobre criar condições para que a organização como um todo prospere. A chave do sucesso está na capacidade de conectar estratégia com execução, pessoas com processos e cultura com transformação. 

 

6 Tendências para a Liderança da Inovação 

O futuro da inovação se desenha como um espaço de conexões humanas mais profundas, tecnologia a serviço da estratégia e uma cultura organizacional que equilibre performance com propósito. Algumas tendências que podem ajudar as organizações a se adequarem em estrutura para endereçar melhor a visão de futuro são: 

  1. Abertura e colaboração como pilares centrais

A inovação do futuro exige que as organizações abandonem o isolamento e adotem práticas de inovação aberta. Isso inclui não apenas parcerias com startups, universidades e fornecedores, mas também a colaboração direta com concorrentes, em um modelo de coopetição. O diferencial competitivo, nesse contexto, deixa de estar na exclusividade de tecnologias iniciais (TRL 1 a 3) e passa a residir na execução, na experiência do cliente e na capacidade de adaptação ao mercado. 

Essa mentalidade aberta exige uma mudança cultural significativa, onde o medo de “perder vantagem competitiva” é substituído por uma confiança estratégica nos ganhos coletivos. Governança flexível e descentralizada será essencial para fomentar essa integração. 

  1. Centralidade em dados e tecnologia

O uso de inteligência artificial (IA) e análise de dados já transforma a forma como líderes de inovação tomam decisões. A tendência é que essas tecnologias sejam cada vez mais integradas às estratégias organizacionais, permitindo análises preditivas, otimização de recursos e acompanhamento em tempo real do impacto das iniciativas. 

No entanto, líderes precisarão equilibrar a confiança nessas ferramentas com uma abordagem crítica e estratégica. Dados são fundamentais, mas o discernimento humano para interpretar e contextualizar essas informações será a chave para evitar decisões mal direcionadas. 

  1. Novas formas de trabalho impactando na cultura de inovação

O avanço do trabalho remoto e híbrido trouxe ganhos de flexibilidade, mas também desafios para a colaboração e o engajamento. A ausência de interações presenciais pode enfraquecer a criatividade e dificultar o desenvolvimento de relações de confiança dentro das equipes. 

Para superar isso, as estruturas organizacionais precisarão incentivar encontros regulares — presenciais ou virtuais — que promovam conexões significativas. Além disso, será crucial adotar práticas que valorizem o aprendizado contínuo e o desenvolvimento pessoal, mesmo em ambientes altamente digitalizados. 

  1. O papel do líder no futuro do trabalho

O líder de inovação do futuro deve atuar como um orquestrador de cultura e um facilitador de conexões. Para isso, ele precisa: 

  • Walk the talk: Demonstrar, por meio de suas próprias atitudes, os valores e comportamentos que quer fomentar na organização. 
  • Apoiar o aprendizado contínuo: Criar ambientes onde a curiosidade e a troca de conhecimento sejam incentivadas. 
  • Manter a proximidade: Encontrar maneiras de fortalecer o senso de pertencimento em equipes dispersas geograficamente. 

 

  1. Horizontalidade e governança flexível

Outra tendência é a evolução para modelos de governança horizontal, onde decisões são tomadas em rede, e não apenas de forma hierárquica. Essa abordagem permite maior agilidade e cria oportunidades para que colaboradores em todos os níveis contribuam ativamente para a inovação. 

Líderes precisarão aprender a equilibrar o poder de decisão entre diferentes atores do ecossistema, promovendo um modelo ganha-ganha que valorize a confiança e a colaboração. Para que isso funcione, as empresas precisarão criar mecanismos de governança que assegurem alinhamento estratégico e resultados mensuráveis. 

  1. Confiança e mindset “giver”

Por fim, as organizações que mais se destacarão na próxima década serão aquelas que souberem criar um ambiente de confiança. Isso envolve: 

  • Confiar nas pessoas para propor ideias e assumir riscos calculados. 
  • Confiar nos parceiros para construir soluções conjuntas. 
  • Confiar nos dados para embasar decisões estratégicas. 

A liderança para inovação exigirá um mindset de contribuição. Como Jamil bem aponta, líderes precisam ser mais “givers” do que “takers”, fomentando redes de colaboração que beneficiem tanto a empresa quanto o ecossistema como um todo. 

 

Inovação Raiz e não Nutella 

A inovação que transforma vai além do modismo e requer profundidade, resiliência e uma interlocução ativa com todos os atores do ecossistema. Jamil Farkatt reforça a importância de investir tempo e recursos não apenas para criar soluções inovadoras, mas para consolidar uma cultura de inovação robusta e enraizada na organização. 

  • Conhecimento como base para a inovação profunda: Para alcançar resultados consistentes, é fundamental que as organizações busquem um equilíbrio entre velocidade e profundidade. Isso significa aliar conhecimento acadêmico, experimentação prática e a contribuição de startups, universidades e especialistas externos. O desafio, segundo Jamil, está em evitar a “inovação Nutella” — superficial e focada apenas em branding —, e priorizar ações que tragam impacto real para o mercado, para o meio ambiente e para a sociedade. 
  • Resiliência e disciplina no processo de inovação: A inovação não acontece da noite para o dia. Ela exige resiliência para enfrentar barreiras culturais e disciplina para sustentar iniciativas a médio e longo prazo. Como Jamil aponta, “inovação é sobre encontrar convergência em meio à divergência”. Isso requer um planejamento estratégico sólido e a capacidade de engajar diferentes atores, desde executivos até startups, promovendo uma evolução contínua dentro da organização.
  • A força da interlocução e da cooperação: A inovação de impacto emerge da capacidade de estabelecer conexões e construir pontes entre os diversos atores do ecossistema. Jamil acredita que a confiança é a base para essas interações, permitindo que empresas, universidades, startups e hubs de inovação trabalhem juntos para enfrentar desafios complexos. Ele destaca a importância de avançar de forma gradual, começando com sensibilização e capacitação, passando por programas de relacionamento com startups e evoluindo para um modelo de maturidade onde as organizações criem spin-offs e até fundos de investimento em inovação. 

 

Mensagem final 

Jamil encerra com um convite à reflexão: “A inovação não é mais uma oportunidade, mas uma necessidade estratégica. Ela deve ser planejada, fundamentada e executada com disciplina, para realmente transformar as organizações e gerar valor sustentável para a sociedade. Somente assim construiremos um ecossistema mais diverso, resiliente e conectado.” 

Se você quer levar a inovação a sério, adote a resiliência como aliada e o conhecimento como guia. O futuro da inovação pertence a quem se aprofunda, coopera e tem coragem de transformar. 

Para quem deseja aprofundar as discussões ou buscar insights adicionais sobre inovação, Jamil Farkatt está disponível para conversas e trocas no LinkedIn: Jamil Farkatt. Ele é conhecido por sua abordagem prática e por ser um “giver” dedicado a compartilhar conhecimento para fortalecer o ecossistema de inovação.